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Festa do Caju mantém viva a tradição que já dura 42 anos

A comemoração festejando São Pedro já existe há 42 anos e é um evento que mobiliza toda a população de Uruaçu e algumas cidades vizinhas. Mesmo com a falta do marido dona Flora com pulso forte guia seu povo conservando a tradição da Festa do Caju.

Dona Flora e seus 14 filhos momentos antes do terço de São Pedro
Dona Flora e seus 14 filhos momentos antes do terço de São Pedro

A Festa do Caju é uma comemoração em homenagem a São Pedro, denominada assim em respeito ao Ediberto Rodrigues Batista, o popular Caju, um apaixonado pelo futebol e grande devoto de São Pedro. O Estádio Cajuzão em Uruaçu é uma homenagem a esse homem que foi exemplo de trabalho, amor à família, à São Pedro e ao futebol. A comunidade do Caju foi criada com a união do casal (Flora e Caju) no final dos anos 50, porém a devoção à São Pedro já era praticada pelos antepassados de Dona Flora.

Seu Caju tinha o ofício de serrador e do casamento com Dona Floriana da Silva Batista, mais conhecida como Dona Flora nasceram 14 filhos sendo 9 homens e 5 mulheres. Dona Flora trabalhou de lavadeira de roupas, cozinheira ou de qualquer outro trabalho doméstico para ajudar criar a enorme família. Enumerando com os dedos ela se esforça para lembrar os nomes: Juvenil, Juraci, Juci, Jucimar, Florisberto, Valdirê, Jucirlei, Júlio, Sidnei, Valdeci, Valcilene, Valmirene, Valdirene e Luciana.

A casa construída por eles e é onde se realizam os festejos, hoje está situada no setor nobre da cidade de Uruaçu e a especulação imobiliária os espreme, mas mesmo assim continuam firmes.

Há poucos dias foi cortado um jatobá plantado pelo senhor Caju para dar lugar à uma rica construção. Dona Flora adoeceu e aproveita os restos do tronco para mesas, bancos e os galhos serviram para acender a fogueira de São Pedro.

Triste ela olha todos os dias os restos do jatobá e pede aos filhos para que continuem a tradição e não deixem que o progresso engula sua comunidade.

A comunidade do Caju é formada pelos filhos, dezenas de netos, noras e outros parentes e é um símbolo da resistência quilombola em Goiás, apesar da falta dos pioneiros a tradição continua na moradia, festas, gosto pelo futebol e comidas, liderada por Dona Flora, hoje com 74 anos de idade.

Esse povo possui uma relação indireta com a experiência do regime escravo, as histórias contadas pelos mais velhos e o sobrenome Silva Rocha é o resultado dessa relação. O avô de dona Flora, o Duruteu Silva Rocha, veio de Niquelândia e de lá trouxe muitos causos comprovando a ligação da família com a experiência da escravidão.

No início as manifestações quilombolas eram apresentadas fielmente como a dança Marimbondo Sinhá, a Dança do Tambor e outros, que aos poucos estão sendo substituídas por danças mais modernas, o que é uma pena.
“Tainha do João Batá
Ela custa dinheiro
Que custo ganhá
Nego o que ocê tem
É marimbondo Sinhá”
Segundo dona Flora os mais jovens não gostam dessas danças antigas. O Marimbondo Sinhá é uma dança ao som de tambores, um ritual para afastar os marimbondos com gestos e tapas.

As primeiras festas eram celebradas ao som das violas e dos tambores, depois com sanfonas e hoje o som é um violeiro que acompanha a procissão.

No dia de São Pedro a casa de Dona Flora é o local mais visitado da região, centenas e até milhares de pessoas de várias cidades participam do ritual da procissão, levantamento de mastro, rezas, fogueiras e danças.

As ruas são fechadas por inúmeras barracas com todo tipo de bebidas e comidas típicas. Dona Flora faz questão de comandar toda a organização da festa, inclusive o preparo dos bolos tradicionais como quebrador, pão de queijo, bolo de arroz na palha de banana e os frangos para o leilão. A família tem local privilegiado para vender seus produtos.

Momento marcante é o início da procissão onde à frente com a bandeira de São Pedro dona Flora comanda o ritual e as pessoas a seguem com uma vela acesa e entoando as rezas cantadas. No quintal da casa uma fogueira aguarda a chegada da procissão e à luz da lua o mastro de São Pedro é levantado ao som da musica. É um momento emocionante, as pessoas compenetradas assistem a repetição da música e quando o mastro é colocado os foguetes explodem e o povo grita “Viva São Pedro, Viva”.

“São Pedro vai pro céu…
Ele vai pra o céu tão alto
São Pedro vai subir
Viva o Capitão do mar…
São Pedro ta subindo
Subind pro céu tão alto
A procissão retorna e São Pedro é devolvido ao altar quando começa a reza tradicional. O terço é rezado e cantado e algumas mulheres rezam trechos em latim abrasileirado, ou seja um latim transmitido pela oralidade, conforme observou o historiador Edson Arantes (UEG).

Após uns 50 minutos de rezação as pessoas se despedem de São Pedro e começa o forró comandado por um cantor local.

O forró se estende noite a fora e quando o dia começa a clarear dona Flora tem o rosto cansado mas feliz, afinal conseguiu junto com os filhos, noras e dezenas de netos realizar mais uma devoção de fé à São Pedro, que segundo ela, não deixará morrer a Festa do Caju.

Dia já claro, a fogueira vai se apagando e restam somente as cinzas do jatobá que junto com a família acompanhou a história da Festa do Caju, a maior manifestação cultural da região e que a qualquer momento pode ser sucumbida pelo progresso.

 

Sobre Osvando Teixeira

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